ENVELHECER


Cecilia Meireles

Como a velhice é considerada  a última etapa da vida, torna-se mais freqüente o pensar sobre a morte e sobretudo sobre o que vem depois da morte. Esta questão mereceria um MOMENTO DE REFLEXÃO à parte.

Se a morte parecia uma questão longínqua, pouco pensada,antes dos 50 anos, não apenas as limitações pessoais progressivas, como as mortes circundantes tornando-se mais freqüentes: dos pais, dos parentes e amigos forçosamente nos leva a pensar no assunto.
Costuma-se dizer que o idoso terá sua velhice como conseqüência do que foi sua vida até ali. A personalidade é uma construção. Ninguém é o que é por acaso. É fruto da maneira como viveu cada uma das etapas da vida, dos objetos e desejos que cultivou durante a vida. A velhice deve ser compreendida não como uma involução, retrocesso, mas como uma evolução. Alguma coisa que se inscreve no processo de avançar.

"Do que tiveres do pomar plantado apanha
os frutos e recolhe as flores;
Mas lavra ainda a planta do teu eirado,
que outros virão colher quando te fores. "
Envelhecer - Bastos Tigre

A velhice não está nos anos somados.O que entristece na velhice é a sensação de não ser útil, de não ser observado...Também aquela sensação de que o seu tempo terreno está acabando, a saudades do que foi vivido, a contemplação dos erros e do que deixou de ser feito:

Devia ter amado mais
Ter chorado mais
Ter visto o sol nascer
Devia ter arriscado mais
E até errado mais
Ter feito o que eu queria fazer...

[...]Devia ter complicado menos
Trabalhado menos
Ter visto o sol se pôr...

Epitáfio
Titãs

Envelhecer é a sensação de que tudo se foi muito depressa, e que só nos damos conta disso quando o tempo da vitalidade passou. E quando nos contemplamos ao espelho vêm a pergunta que Mario Quintana se fez em "Espelho"

Quem é esse que me olha e é tão mais velho que eu? (...)
Parece meu velho pai - que já morreu! (...)


Cecília Meireles tem seu momento de contemplação diante do espelho e que ela exprime em seu poema "Retrato"

"Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios, nem o lábio amargo.
Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração que nem se mostra.
Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
Em que espelho ficou perdida a minha face?"
Cecília Meireles


O 11 de Setembro e a lição de intolerância

O atentado de 11 de setembro já serviu para todo tipo de loucura. Respaldado no lamentável atentado em que as Torres Gêmeas de Nova Iorque foram colocadas abaixo devido ao choque de aviões comerciais seqüestrados e lançados contra elas por integrantes de grupos radicais, o governo Bush partiu para a imbecil batizada “guerra preventiva”, e o que se viu de lá para cá foi o recrudescimento da violência, do ódio racial e religioso, de mais guerra, atentados terroristas e milhares de feridos e mortos, a maioria inocentes que ficaram no meio dos insanos e fanáticos.


O mundo não ficou um milímetro mais seguro, pelo contrário.

Agora surge esse outro louco, que intitula pastor, e avisa que vai queimar exemplares do Alcorão. Atiçar ódios e gerar um clima de mais insegurança é o que ele vai conseguir, ainda que seu objetivo principal seja o de aparecer, o que, aliás, está conseguindo.

Não importa ao leviano e irresponsável senhor dos grandes bigodes e nenhum princípio moral e religioso que seu ato possa ter conseqüências desastrosas, motivando outras mentes doentes como a sua, a retaliar em nome de “Deus”.

Uma coisa é certa, o pastor (?) vai conseguir mais adeptos para a sua igreja, e vai faturar umas ofertas a mais.

Ferreira Gullar - 80 anos de poesia

Dia 10 de setembro, José Ribamar Ferreira, mais conhecido como Ferreira Gullar, o poeta, completa 80 anos. Para marcar a data ele lança um novo livro, “ EM ALGUMA PARTE ALGUMA”, onze anos depois de publicar seu último livro: “MUITAS VOZES”.


Tido por muitos como o mais importante poeta brasileiro em atividade Gullar, em entrevista a Humberto Werneck diz não ver nenhuma significação especial ao chegar aos 80 anos. “O fato é que estou um ano mais velho”. Acredita estar hoje uma pessoa mais generosa e tolerante capaz de compreender melhor o que antes não compreendia ou compreendia errado.

“Eu não quero ter razão, eu quero é ser feliz”.

Em seu poema O DUPLO, inédito a ser lançado no novo livro, Gullar faz uma análise maravilhosa de si mesmo e de sua maturidade.

O DUPLO

Foi-se formando
a meu lado
um outro
que é mais Gullar do que eu

que se apossou do que vi
do que fiz
do que era meu

e pelo país
flutua
livre da morte
e do morto

pelas ruas da cidade
vejo-o passar
com meu rosto

mas sem o peso
do corpo
que sou eu
culpado e pouco